Debate mulher negra

Debate discute papéis da mulher negra

Em 25/11/20 13:36. Atualizada em 25/11/20 13:36.

Evento que comemora o dia da Consciência Negra manifesta coletividade como forma de resistência e luta 

Maria Eugênia Nalini

“Ser mulher negra é uma essência, não é uma sentença. Ser mulher negra é gerir dores, mas é também construir empoderamento. Isso acontece coletivamente”. A fala posta por Luciana Oliveira Dias, antropóloga pós-doutora em Direitos Humanos e Interculturalidades pela Universidade de Brasília (UNB) e coordenadora do Coletivo Rosa Parks, constituiu o debate "O Futuro da Mulher Negra no Brasil", realizado no dia 24/11. A transmissão promovida pelo Sistema de Bibliotecas da Universidade Federal de Goiás (Sibi/UFG), em parceria com o Instituto de Química (IQ), a Faculdade de Ciências Sociais (FCS) e a Reitoria Digital, ocorreu ao vivo no canal oficial da UFG no YouTube.

Além da professora Luciana, estiveram presentes Rose Mendes da Silva, mediadora componente do Sibi/UFG, e a convidada Anna Maria Canavarro Benite, doutora em Química pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), docente na área de cultura e história africana no ensino de ciências e ativista do Grupo de Mulheres Negras Dandara no Cerrado. A discussão, apresentada em formato de exposição e debate, afirma sobre o papel da mulher negra na sociedade contemporânea e como as relações etnico-racias compõem estereótipos que precisam ser questionados.

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Iniciando a discussão, Anna Benite aborda as condições sociais que contemplam o futuro das mulheres negras no Brasil, principalmente no que tange a área de ciência e tecnologia. A doutora pontua que a ciência desenvolvida a partir de um modelo binário de produção, que divide as determinações em sistemas de conhecimento e não conhecimento, homem e mulher, branco e negro, induz a expropriação da capacidade criativa laboral das pessoas negras, fato que desqualifica produções que fogem do sujeito universal privilegiado, o homem branco.

A professora levanta que o Brasil, com maioria da população composta por mulheres e indivíduos autodeclarados negros, retira de si mais da metade das mentes criativas do país quando não investe “em ciência e tecnologia por meio do olhar de uma mulher negra”. Isso acarreta em um entrave do desenvolvimento social do país, que fica à mercê de um pensamento hegemônico dissertado por pessoas brancas. Nesse sentido, Benite aponta o quão relevante é ter consciência do projeto de poder que constitui a prática racista e como isso precisa ser combatido e discutido abertamente.

Representatividade

Benite coloca que a sociedade deturpou o papel de mulheres, principalmente os atribuídos às mulheres negras, ao moldar um sistema embasado no racismo, no machismo, no patriarcado e nos estereótipos de gênero. Nesse aspecto, a ativista expõe que é essencial que se reconheça a escassez da representatividade e que se estude, se discuta, que se cite e aborde as produções plurais de mulheres negras nos currículos acadêmicos, para que se desenvolva uma demonstração constante de resistência e potencialidade dessas vivências.

Nesse sentido, a doutora expõe: “Quando eu digo que uma mulher negra produz ciência de qualidade, uma ciência de alto impacto, é porque ela venceu o marcador interseccional que interdita esse corpo nesses espaços, que é raça e que é gênero”.

Coletividade

Em um segundo momento, Luciana Dias discorreu sobre a ressignificação da presença negra no Brasil, pautando que “sem o antirracismo, qualquer política fica inviabilizada”. Para a professora, é essencial que se evidencie a pluralidade e a diversidade de mulheres negras, e que se apresentem exemplos de contribuição de intelectuais negras para que se dialogue sobre as suas presenças na sociedade.

Para expor o assunto, a pós-doutora trouxe o conceito de “dororidade”, elaborado pela ativista Vilma Piedade, que diz respeito à dor e às experiências que somente mulheres negras reconhecem e compreendem. Nesse sentido, Dias coloca que a sororidade, parceria solidária entre mulheres, explanada pelo feminismo branco, não é capaz de alcançar as vivências negras em sua totalidade. Esse fato somente ressalta preconceitos e reforça a interseccionalidade, definição que trata dos eixos de opressão, de dominação e de exclusão que compõem a realidade da pessoa negra no Brasil.

Por outro lado, Luciana manifesta a resistência e o empoderamento da mulher negra, que exige a problematização de uma narrativa hegemônica, composta majoritariamente por sujeitos universais brancos. Segundo a professora, é fundamental que se politize a resistência e se demande incisivamente o reconhecimento por parte do estado, das instituições e de pessoas brancas do traço racista composto pela história brasileira.

“É fundamental às mulheres negras investir na associação em si, na irmandade entre si, ou pela “dororidade” ou pelo empoderamento. Essas mulheres precisam estar juntas, porque juntas a gente é mais forte, a gente atua de maneira mais eficaz”, afirma Dias. Nesse sentido, a antropóloga aborda a inevitabilidade do autocuidado como uma estratégia coletiva de resistência de mulheres negras, no que se refere a atuação para a modificação do cenário que oprime formas de ser e existir.

 

Fonte: Secom UFG

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